Uma investigação das relações entre as igrejas neopentecostais e o varejo de drogas e o crescimento do racismo religioso
Em A culpa é do diabo: O que li, vivi e senti nas encruzilhadas a pesquisadora Carolina Rocha investiga a complexidade das relações estabelecidas, em termos de disputas político-religiosas, entre neopentecostalismo, varejo de drogas ilícitas e religiosidades afro-brasileiras em algumas das favelas do Rio de Janeiro.
Por meio das histórias ouvidas, sentidas e vividas no cotidiano de diferentes grupos e pessoas, que, muitas vezes, estão em meio aos conflitos da violência urbana, a autora tece narrativas e interpretações sobre os múltiplos significados e propostas em disputa. Na disputa de territórios e de repertórios, operacionalizados em episódios conturbados e brutais, este livro aponta para os múltiplos significados de morte, de guerra, de pecado, de luta e de exorcismo constantemente acionados por grupos diversos, incluindo o próprio Estado.
Desse modo, Carolina, ao trazer personagens reais para dar seus testemunhos de vida e de sobrevivência, proporciona ao leitor a possibilidade de entender o contexto para além de números e dados, abarcando as vivências. Nas palavras da autora, “Eu sentia que essa etnografia era importante de ser produzida e publicizada, mas não sabia como transformar tudo que ouvi, li, vivi e senti em texto, sem colocar ninguém em risco e, ao mesmo tempo, me colocando no risco que é estar vulnerável a críticas, a questionamentos, a discordâncias e a afetos.”
A pesquisadora aponta para o fato de que, embora seja possível traçar aspectos comuns a todo esse emaranhado de acontecimentos, eles não são uniformes, ou seja, cada favela, cada grupo, cada localidade apresenta suas peculiaridades. Desse modo, em sua pesquisa, ela observa que os fatos e as dinâmicas sociais hoje, em relação às disputas e às violências mobilizadas dentro de uma gramática religiosa, nas favelas e nas periferias do Rio de Janeiro, só é possível porque existem contextos e articulações anteriores e superiores (em nível de proporções e de investimentos de capital simbólico, político e econômico). Vale notar, entretanto, que, na maioria das vezes, o que ganha notoriedade nos discursos públicos oficiais é só a ponta de uma longa corda, ocultada por diversos interesses.
Dessa forma, A culpa é do diabo é um livro incontornável para todas as pessoas interessadas em se informar acerca das complexas (e contraditórias) relações estabelecidas entre religiosidades, violências e discursos opressores nas periferias das grandes cidades brasileiras do princípio do século XXI.