A bomba embaixo da mesa, sequência do sucesso Storytelling, traz novas reflexões sobre a confusão entre realidade e ficção e a influência da tecnologia na narrativa.
Sem conflito não há história. Aristóteles sabia disso tanto quanto os roteiristas dos filmes e séries que vemos na Netflix. As obras literárias e audiovisuais citadas neste A bomba embaixo da mesa, caminhando lado a lado com os relatos históricos e jornalísticos, não deixam dúvidas sobre a importância do conflito e se apresentam como uma espécie de curadoria temática, lista premium a ser degustada posteriormente pelo leitor.
O ponto principal do livro é a inédita participação do público no desenrolar da história após o advento da internet, com níveis de poder e vulnerabilidade jamais vistos, uma gigantesca plateia mundial sujeita a decisões tomadas por algoritmos, exposta aos estratagemas de manipuladores sem freios, encantada com a sensação de protagonismo, e muito disposta a opinar e brigar. Como destaca o autor: “Conhecemos bem as narrativas de gente lutando para sobreviver ou conquistar algum sonho nas mais variadas épocas e circunstâncias. Chegou a hora de irmos além, atravessando o pano de fundo que serve às histórias, para alcançar um outro, onde estão as pessoas a quem as histórias são contadas.”
O livro trata dos conflitos basilares da história e das estórias, desde o ancestral bem x mal até o recente real x virtual, passando pelos clássicos Deus x Diabo, ricos x pobres, masculino x feminino e esquerda x direita, entre outros. Mostra o quanto realidade e ficção se confundem e se influenciam reciprocamente, e o quanto as novas tecnologias contribuem para embaralhar tudo. Em suas páginas, convivem a Arca de Noé e o Titanic, políticos como Zelensky, Putin, Trump, Bolsonaro, Mandela e Lula, personagens como Batman, Coringa, Robin Hood e Cinderela, líderes como Papa Francisco, Joana d’Arc e Greta Thunberg, marcas como Nike, Coca-Cola, Burger King e outras que foram em maior ou menor grau empurradas para o debate ideológico, eventos históricos como as revoluções francesa e russa, as cruzadas e a invasão do Capitólio, além de escritores, cineastas, publicitários, comunicadores e artistas em geral que nos ajudam a enxergar na escuridão.
Trecho do livro: “No lançamento de Storytelling: histórias que deixam marcas, em 2015, eu julgava não ter mais nada a dizer sobre o tema. Dentro do estilo adotado e dos territórios que me propus a percorrer, a missão estava cumprida.
Não contava com a reviravolta narrativa que viria logo depois. O mundo foi invadido por fake news. Personagens caricatos e inverossímeis ganharam destaque na vida real, com roteiros mais impactantes do que os concebidos por especialistas. Alguns desses roteiros desafiavam abertamente a plausibilidade, logo essa qualidade tão indispensável às boas histórias; outros, de tão ruins, jamais seriam aprovados por storytellers de verdade.
Esse descarrilamento roteirístico me motivou a investigar, refletir e retornar ao teclado. Mergulhei em águas mais turvas, colocando lado a lado os fatos e suas narrativas, registrando a mistura de realidade e ficção, verificando como as cabeças criativas captam a essência do momento histórico, tanto para descrevê-lo quanto para interpretá-lo, tentar corrigi-lo ou prevenir catástrofes.”